Política Energética no Brasil: pauta precisa acelerar mudanças

Falar em modernização do setor elétrico brasileiro não significa limitar-se a tratar das novas tecnologias disponíveis e suas aplicações. É fundamental colocar lado a lado da inovação tecnológica a modernização regulamentadora, tarifária e a oferta de serviços que acolham um novo perfil de consumidor. Enfim, é preciso falar sobre Política Energética no Brasil.

O assunto é tão importante, pois implica diretamente a escalada da geração de energia distribuída ao longo do país que, por sua vez, fomenta uma inédita relação entre consumo e produção, bem como agrega patamares mais elevados de sustentabilidade ao setor elétrico.

Na era dos prossumidores, ou seja, o consumidor que pode utilizar para si ou disponibilizar a terceiros parte da energia que ele mesmo produz, temas como digitalização das redes e atualização regulatória são centrais. Isso porque essa nova formatação operacional coloca o usuário final em destaque, com a ponta da operação passando a acumular as tarefas de geração, distribuição e, claro, o consumo de energia.

Esse movimento de modernização, ainda muito caracterizado por um esforço bottom-up, precisa inverter seu sentido, e ser fomentado de forma top-down, não apenas para acelerar a inovação e democratizá-la, mas também para diminuir a assimetria já instalada entre o padrão de consumo na ponta, cada vez mais digitalizado, e os provedores de serviços, ainda analógicos.

Tudo isso, claro, requer uma Política Energética pensada no longo prazo, fortemente estruturada na mudança do status-quo e efetivamente centrada na onda de digitalização por que passa o mundo todo.

Por sinal, o movimento de digitalização, que tem transformado a rotina da sociedade em geral, faz com que pessoas e empresas fiquem cada vez mais dependentes da continuidade e qualidade dos serviços envolvendo energia elétrica. Essa maior dependência não impacta apenas a qualidade de vida das pessoas, mas também as oportunidades de crescimento da economia.

Menos despesas e mais eficiência operacional

Embora aconteça em ritmos diferentes a depender do setor, a transformação digital é uma realidade inegável entre as utilities de todo o mundo. Ganhos como o aumento de eficiência operacional, melhoria na experiência do consumidor e agilidade na inovação (e consequente ganho em competitividade) são apenas alguns dos fatores que têm transformado esse mercado. E esse é mais um dos motivos pelo qual sistematizar uma Política Energética em âmbito nacional é tão importante.

Dados do McKinsey Global Institute apontam que a transformação digital cria  grande valor para as utilities. Entre eles, destacam-se:

  • redução de até 25% em despesas operacionais;
  • aumento de performance entre 20% e 40%, especialmente em áreas como segurança e satisfação do consumidor;
  • aumento no lucro.

Política Energética no Brasil: gestão de eficiência precisa progredir

A geração e o consumo de energia elétrica estão entre os maiores entraves contra a alavancagem produtiva da indústria brasileira. Um estudo elaborado pelo American Council for an Energy-Efficient Economy colocou o Brasil entre os últimos cinco colocados de uma lista com 25 países, no que se refere às políticas públicas e práticas empresariais para a gestão eficiente de energia.

Entre as principais razões que explicam o baixo desempenho brasileiro destaca-se o investimento insuficiente em inovação. Apenas para comparar, enquanto direcionamos cerca de 191 milhões de dólares por ano para projetos de eficiência energética, a Alemanha já ultrapassou o montante de 2,5 bilhões de dólares, ou seja, cerca de 13 vezes mais.

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O desperdício de energia é também um outro importante ponto de atenção. Dados divulgados pela ABESCO (Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia) mostram que, entre 2014 e 2016, o Brasil desperdiçou o equivalente a 140% do montante anual gerado pela usina de Itaipu. São mais de 60 bilhões de reais que poderiam ter sido salvos caso tivéssemos investido mais pesadamente em tecnologia.

Smart Grids: descarbonização e redução de perdas não técnicas

Pesquisas indicam que ao menos 25% do total de gases do efeito estufa seriam resultado do processo de geração de energia com base não renovável. Justamente para reverter esse quadro, as Smart Grids impõem-se como a solução mais avançada para a descarbonização das redes de energia elétrica, com vistas a fomentar a produção de energia limpa.

No Brasil, embora a matriz elétrica seja aproximadamente 86% renovável, observa-se que grande parte do que é gerado e transmitido sofre com as chamadas perdas técnicas e não técnicas, antes de chegar ao destino final. De acordo com a IBM, 14,7% do total de energia produzida no país são dissipados no processo de distribuição. Em algumas regiões, esse montante pode alcançar 40%.

Segundo Ben Gardner, presidente do Northeast Group — empresa norte-americana de inteligência de mercado voltada à infraestrutura —, entre os principais motivadores que alavancam o potencial de novos projetos de digitalização das redes de energia elétrica, destaca-se justamente o grande esforço em diminuir as perdas não técnicas. Apenas para colocar em números, a taxa de perda sul-americana de transmissão e distribuição (T&D) atinge quase 15% e está entre as mais altas do mundo.

Grandes economias em curto e médio prazo são verificadas pelas empresas que já adotam as tecnologias de medição inteligente, o que acaba por estimular outras do setor a seguirem o mesmo caminho. Com isso, otimizam-se importantes somas em recursos (financeiros e ambientais), que podem inclusive reverberar aos consumidores finais na forma de tarifas mais baixas.

Projeções recentes indicam que o mercado total de infraestrutura e projetos de Smart Grid na América do Sul alcançará o valor acumulado de US$ 20,1 bilhões, até 2027*. Desse total, mais de US$ 10,2 bilhões serão obtidos apenas com os projetos de medição inteligente.

*Esses dados podem ter sofrido alterações em razão da pandemia de Covid 19